Projeções do mercado para juros em alta, inflação e crescimento pioram. Analistas explicam por quê

Projeções do mercado para juros em alta, inflação e crescimento pioram. Analistas explicam por quê

Por Edmilson Pereira - Em 7 meses atrás 75

O mercado elevou para 10% a projeção para a Selic, taxa básica de juros da economia brasileira, no fim deste ano. É o terceiro aumento consecutivo registrado pelo Boletim Focus, que reúne estimativas de analistas compiladas pelo Banco Central, para os juros. Na semana passada, eles projetavam 9,75%. O Focus também apontou maior inflação, dólar mais alto e menor crescimento econômico este ano.

Essa mudança reflete as preocupações com o controle das contas públicas no Brasil e as incertezas em relação ao comportamento dos juros nos Estados Unidos.

Para o IPCA, as estimativas do Focus em 2024 passaram de 3,76% para 3,80%. Lucas Farina, economista da Genial Investimentos, explica que as projeções do mercado começaram a se descolar ainda mais das metas fixadas para a inflação depois da divisão na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que reduziu a Selic em 0,25 ponto percentual, para 10,5% ao ano.

— Tivemos uma maior desancoragem das expectativas futuras de inflação por conta dos desdobramentos do voto rachado, que passou uma percepção de uma ala mais hawkish (restritiva) e outra mais dovish (flexível). A nova diretoria que assume no ano que vem pode entrar com uma credibilidade arranhada. Ainda temos que esperar para ver, mas basta a percepção para fazer preço, principalmente nas expectativas — afirma Farina.

Segundo fontes ouvidas pela Bloomberg, em reunião privada com diretores do BC, economistas disseram não ver espaço para mais cortes na Selic, devido ao aumento das expectativas da inflação.

Os analistas presentes na reunião levantaram receios de que o Copom se torne mais brando em relação à inflação, disseram as fontes. A maior parte deles projeta o IPCA acima da meta de 3%, e há quem aposte que pode chegar a 4%.

Com relação ao cenário externo, a projeção de um dólar mais elevado no fim deste ano — as estimativas do Focus passaram de R$ 5 para R$ 5,04 — deve-se à mudança no cenário de juros nos Estados Unidos. Espera-se que o Federal Reserve (Fed, o BC americano) cortasse a taxa, hoje no intervalo entre 5,25% e 5,5%, ainda em junho.

Mas os últimos dados mostram uma inflação resistente, e membros do Fed já sinalizaram que os juros ficarão nesse patamar por mais tempo.

Juros altos nos EUA tornam os investimentos em renda fixa lá mais atraentes que os de economias emergentes, como o Brasil, considerados de maior risco, explica Farina.

— Revisamos nossa taxa de câmbio de R$ 5,05 para R$ 5,15 no fim do ano, por conta dos juros nos Estados Unidos — diz o economista da Genial.

— Há uns dois meses, o mercado tinha um ou dois dados de inflação ruins nos Estados Unidos. Mas passou um tempo e foram três, então o mercado ficou com medo de que em maio tivesse mais um dado ruim. A história está presente faz tempo, mas a intensidade mudou.

O economista Álvaro Bandeira, coordenador de Economia da Apimec, lembra que a tragédia no Rio Grande do Sul contribuiu para a piora nas projeções do PIB, de 2,09% para 2,05%. Ele avalia que o Focus ainda deve mostrar novas pioras nas estimativas nas próximas semanas.

— O PIB provavelmente vai ter um impacto dessa tragédia no Rio Grande do Sul. O mercado está começando a incorporar esse choque e vai reduzir, em alguma medida, a projeção para este ano. Fora que uma Selic mais alta também pode levar o mercado a ver um crescimento um pouco menor — afirma Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo Corretora.

Para Farina, ainda é preciso esperar pelos próximos dados para se ter uma noção mais precisa do tamanho do impacto das enchentes na economia.

Ibovespa recua 0,31%

O Focus teve impacto no Ibovespa, que fechou em queda de 0,31%, aos 127.751 pontos. Nos juros futuros, os contratos com vencimento em janeiro de 2025 permaneceram estáveis, em 10,37%, mas aqueles com vencimento em janeiro de 2026 subiram de 10,655% para 10,70% e os com vencimento em janeiro de 2027 avançaram de 11% para 11,05%.

— Na ponta mais curta da curva de juros, o mercado praticamente não precifica nenhum corte na Selic, mas vemos um aumento olhando mais para a frente, em parte não só porque a Selic subiu para 10% no Focus, mas porque as expectativas da inflação continuam subindo — explica Costa.

Jornal O Globo

Foto: Divulgação