Justiça acata ação do MPPB e condena Estado da Paraíba a pagar R$ 500 mil ao FDD, por descumprimento de decisão judicial
Por Edmilson Pereira - Em 1 ano atrás 278
O Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) acolheu o pedido do Ministério Público (MPPB) e condenou o Governo do Estado da Paraíba ao pagamento de R$ 500 mil, pelo descumprimento da decisão judicial referente à Ação Civil Pública 001389295.2013.8.15.0011, ajuizada em razão de diversas irregularidades constatadas na Penitenciária Regional Feminina de Campina Grande.
O requerimento do pagamento dos R$ 500 mil foi feito pelo 17º promotor de Justiça de João Pessoa, Ricardo José Medeiros, que atua na tutela coletiva do sistema prisional e direitos humanos, em todo o Estado. Segundo ele, não cabe mais discussão sobre a dívida nos autos, já que os valores executados não foram impugnados pelo Estado, e a quantia deverá ser paga através de precatório em favor do Fundo de Direitos Difusos da Paraíba (FDD/PB).
Para o promotor de Justiça, a medida visa reparar a sociedade pelos danos causados. “A decisão consiste em vitória para a sociedade paraibana, uma vez que o Fundo de Direitos Difusos possui como objetivo arrecadar e gerir recursos financeiros que serão destinados exclusivamente na implementação de projetos sociais e políticas públicas em benefício da sociedade como um todo, como forma de ressarcir a coletividade por danos causados ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, cultural, turístico, paisagístico, infração à ordem econômica e outros direitos e interesses difusos e coletivos, no Estado da Paraíba”, explicou.
Ação civil pública
O MPPB instaurou o Inquérito Civil 03/2012 e constatou diversas irregularidades e o descumprimento da Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), na Penitenciária Feminina de Campina Grande. Apesar das inúmeras tentativas de solução extrajudicial do problema, o Estado da Paraíba manteve-se inerte, levando o MPPB a ajuizar, em junho de 2013, a Ação Civil Pública 001389295.2013.8.15.0011, requerendo a imposição de obrigação de fazer ao Estado da Paraíba (responsável pela administração da unidade prisional), consistente na adoção de 20 providências, sob pena de multa e interdição.
A ação foi julgada pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública de Campina Grande, que, após ouvir o Estado, condenou-o, em 2019, a realizar as reformas e adequações necessárias para a correção dos problemas detectados nas perícias e inspeções indicadas na ação pelo MPPB.
Na decisão, o magistrado determinou que as obras estruturais deveriam ter início em 150 dias contados da intimação da sentença, com sua conclusão em um ano e que as demais obrigações que não dependiam de obras estruturais deveriam ser cumpridas no prazo máximo de 90 dias, tudo sob pena de multa semanal de R$ 5 mil até o limite de R$ 500 mil.
O Estado interpôs recurso de apelação à Quarta Câmara Cível do TJPB, alegando, dentre outras questões, a impossibilidade de o poder Judiciário interferir na execução de políticas públicas pelo poder Executivo; o princípio da reserva do possível e a ausência de previsibilidade orçamentária. O MPPB, por meio de sua Procuradoria de Justiça, ofertou parecer, manifestando-se pelo improvimento da apelação.
A Quarta Câmara Cível do TJPB negou provimento à apelação e manteve a decisão proferida pelo Juízo de 1º grau. Em seu voto, o desembargador-relator, Oswaldo Trigueiro Filho, destacou que “o poder público estadual vem descumprindo regras que visam a garantir o mínimo de dignidade aos custodiados da Penitenciária Regional Feminina de Campina Grande, cuja situação é bastante crítica, conforme devidamente comprovado nos autos”; que “em momento algum o recorrente (o Estado) se insurge contra as irregularidades ou questiona, individualmente, as providências determinadas pelo juízo a quo”; que “o princípio da separação dos poderes não pode ser interpretado unicamente sob a ótica de um Estado liberal”… e que “diante de eventual ineficiência governamental, é inescapável a atuação do Poder Judiciário como vetor garantidor das políticas sociais”.
O processo voltou ao Juízo de 1º grau, que no último dia 8 de novembro, determinou que seja oficiado ao presidente do TJPB a expedição de ordem de pagamento de R$ 500 mil em favor do FDD/PB. Para o promotor de Justiça, Ricardo Medeiros, a ação civil pública e a consequente decisão proferida têm como objetivo a garantia dos direitos dos reeducandos do sistema prisional da Paraíba, além do desestímulo de outras condutas danosas a interesses coletivos extrapatrimoniais. “Decisões judiciais dessa natureza são passos importantes para um melhor entendimento, por parte da sociedade e do poder público, acerca da necessidade de maior atenção à causa da ressocialização de pessoas apenadas”, disse.
Confira as providências requeridas pelo MPPB na Penitenciária Feminina de Campina Grande e que foram julgadas procedentes pelo Judiciário:
1. classificação das presas, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal/prisão processual;
2. instituição e funcionamento regulares da Comissão Técnica de Classificação (CTC);
3. prestação de ampla e regular assistência material com fornecimento de vestuário digno e material de higiene pessoal bem como instalações higiênicas e em quantidade suficiente perante a população carcerária;
4. instalação de local destinado à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração;
5. prestação de ampla e regular assistência à saúde fornecendo-se atendimento médico, odontológico e farmacêutico na penitenciária;
6. prestação de ampla e regular assistência jurídica às presas sem recursos financeiros para constituir advogado, que deverão contar com amplo atendimento pelos defensores públicos;
7. assistência educacional consistente em: instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado, através da possibilidade de realização dos cursos disponibilizados pela UEPB; ensino de 1º grau; biblioteca, no estabelecimento, para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativas e didáticos;
8. prestação de ampla e regular assistência social pelo Estado, com profissional da área designado/incumbido das atividades previstas na LEP (conhecimento dos resultados dos diagnósticos ou exames; acompanhamento do resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias; promoção, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, da recreação; promoção de orientação do assistido, na fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade; obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência Social e do seguro por acidente no trabalho; e colaboração com o egresso para a obtenção de trabalho);
9. instalação de local apropriado e destinado aos cultos religiosos (assistência religiosa);
10. instituição e funcionamento regulares do patronato;
11. instituição e funcionamento regulares do Conselho da Comunidade;
12. instalação de Colônia AgrícoIa, Industrial ou similar;
13. garantia de celas individuais com dormitório, aparelho sanitário e lavatório em condições adequadas ao uso humano, com salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana, e área mínima de 6 m2;
14. organização e atualização permanentes do arquivo da penitenciária em relação às guias de recolhimento/mandados de prisão, com (i) informatização de todos os dabos existentes, (ii) organizar o arquivo e (iii) proibição de designação de pessoa encarcerada para tal finalidade;
15. o pagamento regular das remunerações vencidas e vincendas dos detentos que trabalham (ram)/prestam (ram) serviços ao Estado da Paraíba, respeitando-se o limite mínimo de 3/4 do salário mínimo;
16. respeito à lotação carcerária conforme a estrutura e a finalidade da penitenciária, resguardado o limite mínimo de seis metros quadrados por preso, removendo-se o excedente para outro local adequado;
17. proibição da presença de agentes do sexo masculino na segurança quanto aos compartimentos ocupados por mulheres;
18. instalação de berçário, onde as condenadas/presas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até seis meses de idade;
19. a instalação (i) de seção para gestante e parturiente e (ii) de creche para abrigar crianças maiores de seis meses e menores de sete anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa, com atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas, e horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável;
20. garantia da segurança, com a reforma do prédio (ou, subsidiariamente, a construção de um novo) voltada à implementação de todos os itens necessários ao cumprimento das ordens de prisão, com muros altos, providos de grampos, cercas elétricas, arame farpado, guaritas (e outros elementos de segurança), livre de qualquer vegetação ou objeto que favoreça a escalada-fuga dos detentos e/ou invasão externa, sistema de prevenção a incêndios, o reforço concreto de todas as paredes das celas e dos muros, bem como contingente de agentes penitenciários aptos a garantir a segurança no estabelecimento.
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