Gravações mostram que ministra do governo Lula ofereceu verba à campanha de secretária que teria sofrido racismo

Gravações mostram que ministra do governo Lula ofereceu verba à campanha de secretária que teria sofrido racismo

Por Edmilson Pereira - Em 1 mês atrás 1768

Gravações em poder da Comissão de Ética Pública da Presidência da República (CEP) mostram que a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, do governo do presidente Lula, ofereceu uma saída negociada antes de demitir uma ex-secretária do ministério que, segundo denúncia formulada por servidores da Pasta, teria sido vítima de racismo no exercício do cargo.

O acerto envolveria aumento de “recursos” para entidades no Pará, Estado de origem da secretária, e buscar “dinheiro” até fora do País para um grupo de apoio à campanha eleitoral dela em 2026. Nas gravações feitas por servidores da Pasta e obtidas pelo Estadão, a ministra acenou ainda com a possibilidade de emplacar a secretária em cargo ligado à COP-30, a cúpula climática das Nações Unidas, a ser realizada pela primeira vez no Brasil, em Belém (PA). O “processo ético” envolvendo a ministra entrou na pauta de julgamentos da Comissão de Ética desta segunda-feira, 24.

O pivô do caso é a ex-secretária nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política, Carmen Foro. Procurada, a ex-secretária não quis se manifestar oficialmente. Já o Ministério das Mulheres e a defesa da ministra negaram que Cida Gonçalves tenha feito oferta de contrapartida para que Carmen aceitasse a demissão, seja uma “tarefa” na COP-30 ou repasses de verba do ministério. Também rechaçou a possibilidade de que a ministra tenha sugerido que se envolveria em buscar financiamento externo ao grupo político de Carmen, com vistas à campanha de 2026. A ministra também nega ter se omitido no caso da denúncia de racismo que teria ocorrido em sua Pasta

O Estadão obteve um relato em texto, uma gravação de queixas de ex-servidoras à Corregedoria do ministério e outro áudio em que a própria Cida fala sobre as contrapartidas e a proposta de que construíssem não só a saída acordada como também a futura candidatura de Carmen Foro.

Carmen Foro deixou a equipe do Ministério das Mulheres em 9 de agosto do ano passado. Três dias depois da exoneração, a ministra realizou uma reunião interna com a equipe remanescente na secretaria. No encontro, gravado por servidoras, a ministra relatou que, um mês e meio antes da demissão, buscou um entendimento para a saída de Carmen Foro, mas que ela “não levou muito a sério” e, quando percebeu que era para valer, entrou com atestado médico e pediu férias.

Cida aparece nas gravações dizendo que, caso demitisse também as demais colaboradoras trazidas por Carmen a Brasília, buscaria aumentar “recursos” para entidades locais no Pará e até “dinheiro fora do País” para uma futura campanha eleitoral da ex-secretária, no ano que vem.

“Eu disse para ela que a gente tinha que construir uma saída, porque ela estava muito mais como candidata no Pará do que como secretária nacional. Que a gente construísse a candidatura dela. (…) Atrás de diversos órgãos e instituições, para que ela conseguisse cumprir uma tarefa na COP-30 (…) e ao mesmo tempo a gente começasse a lutar recursos para que o pessoal dela sobrevivesse lá no Pará”, afirmou Cida Gonçalves, segundo uma das gravações.

Em outro momento, na mesma reunião, é possível ouvir Cida falando do risco que a equipe ligada a Carmen perdesse o emprego: “A gente aumentaria o recurso para a questão das entidades lá. Eu correria atrás de dinheiro fora do País, para ter recursos para que vocês fossem o suporte da campanha dela daqui até 2026.”

No áudio obtido pelo Estadão, a ministra afirmou ainda que apoiaria eventual nova candidatura de Carmen Foro e indicou disposição de “montar uma estratégia”, porque a secretária teria que “dobrar” a votação anterior: “Porque (a demissão) não significa que eu não quero que a Carmen eleita, tá gente? Ela continua sendo minha candidata prioritária”.

Em 2022, Carmen Foro candidatou-se pela primeira vez a deputada federal e obteve 36 mil votos. Ela é a segunda suplente no Pará.

Julgamento na Comissão de Ética – As gravações fazem parte do acervo documental de denúncias formalizadas, em outubro de 2024, contra a ministra e outras autoridades da pasta, entre elas, a secretária-executiva Maria Helena Guarezi. Como mostrou o Estadão, ex-servidoras acusaram-nas de supostas práticas de assédio moral. As denúncias foram encaminhas à Controladoria Geral da União (CGU) e à Comissão de Ética.

Fonte: Agência Estadão

Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil