Estudo da FGV aponta que metade das 151 estatais da União poderia ser privatizada
Por Edmilson Pereira - Em 7 anos atrás 917
Do conjunto de 151 estatais da União, incluindo empresas dependentes do Tesouro Nacional, não dependentes e subsidiárias, pelo menos metade poderia ser privatizada, cinco delas, incorporadas, e três, terem funções redefinidas. Essa é a conclusão de um levantamento detalhado em elaboração na Fundação Getulio Vargas (FGV), que montou há um ano o Observatório das Estatais. O trabalho considera dois pilares básicos ditados pela Constituição Federal e que deveriam ser seguidos no ato de criação e manutenção das estatais, em uma economia de mercado: a finalidade social e o interesse coletivo para atuar em áreas em que a iniciativa privada não tem interesse e em questões de segurança nacional.
O estudo mostra que boa parte das estatais e subsidiárias perdeu a função social ou explora segmentos em que o setor privado já está presente. Algumas dessas empresas foram incluídas recentemente no programa de venda de ativos do governo federal, como a Eletrobras e a Casa da Moeda. Para os autores do trabalho, o economista Márcio Holland e o ex-ministro do Planejamento Valdir Simão, a privatização está no rumo certo, mas a venda das estatais não pode ter como justificativa principal o problema de caixa do governo da União.
— Com o retorno da agenda de privatizações, é importante discutir com a sociedade sobre a justificativa para a existência de uma estatal. O tema é muito mais amplo do que o mero interesse fiscalista de governos — disse Holland.
De acordo com o levantamento, das 18 estatais dependentes do Tesouro, seis podem ser privatizadas: Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU); Empresa Brasileira de Comunicação (EBC); Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Paraíba (Codevasp); Companhia Nacional de Abastecimento (Conab); Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Tremsurb) e Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec). A Valec (Engenharia, Construções e Ferrovias S.A.) se tornou obsoleta e deveria se limitar ao gerenciamento da malha ferroviária.
DEFESA E PESQUISA DEVERIAM SER MANTIDAS
Ainda neste grupo, deveriam continuar nas mãos do Estado, porém, empresas de função relevante na área de pesquisa ou em setores estratégicos, como defesa nacional. Estão nessa lista Embrapa, Amazônia Azul Tecnologias de Defesa (Amazul), Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel) e Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A (Nuclep).
Entre as 30 estatais não dependentes do Tesouro, pelo menos 15 podem ser privatizadas ou liquidadas, diz o estudo. Incluem-se aqui as oito companhias docas, a Eletrobras, a Agência Brasileira Gestora de Ativos Garantidores, a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) e a Telebras.
Outras empresas desse conjunto, como os bancos públicos Basa (da Amazônia) e Banco do Nordeste, poderiam ser incorporados ao Banco do Brasil. A Empresa Gestora de Ativos (Emgea), criada durante o processo de reestruturação da Caixa Econômica Federal, poderia ser incorporada ou se tornar um departamento da instituição financeira. A Dataprev também poderia se fundir ao Serviço de Processamento de Dados (Serpro).
Já Correios e Infraero, que também são estatais não dependentes do Tesouro, embora venham registrando seguidos prejuízos, deveriam passar por um amplo processo de reestruturação, ficando menores e com foco em atividades essenciais. A Pré-Sal Petróleo S.A. também deveria ter seu papel rediscutido após as mudanças na estratégia de exploração do pré-sal.
O estudo recomenda a venda das participações do BNDES em grandes conglomerados via BNDESpar; das três subsidiárias do Banco do Brasil (BB-Turismo, Cobra e Corretora); de todas as 38 subsidiárias da Eletrobras, inclusive de parcerias com o setor privado na forma de Sociedade de Propósito Específico (SPE); e de vários braços da Petrobras, que deveria se ater à exploração e refino de petróleo, deixando armazenamento, distribuição e transporte por conta do setor privado.
— A empresa que não tiver função social deve ser privatizada, e o que sobrar tem que passar por um processo de modernização — destacou Holland, acrescentando que, de modo geral, as estatais são altamente deficitárias, ineficientes e prestam um péssimo serviço.
Ele ressaltou que, em 2012, as estatais pagaram R$ 28 bilhões para a União, com destaque para BNDES, Caixa, BB e Petrobras. Em 2016, os dividendos caíram para R$ 2,86 bilhões. Há três anos, completou Holland, os Correios não recolhem dividendos para a União, e, há dois anos, Eletrobras e Petrobras também não pagam nenhum dividendo.
Segundo os autores do estudo, antes de pôr alguns ativos à venda, o governo deveria melhorar a governança das empresas e, assim, aumentar sua atratividade e seu valor. A Eletrobras, por exemplo, vale algo em torno de R$ 20 bilhões — mas a cifra representa um terço do BB Seguridade, por conta dos problemas de gestão e do passivo elevado.
ABUSO DE PODER E PASSIVOS ELEVADOS
Eles observam ainda que parte do prejuízo das estatais tem relação com abuso de poder do controlador, como na corrupção na Petrobras, na queda forçada dos juros cobrados pelos bancos públicos e nas tarifas no setor elétrico. Nesse sentido, avaliam os pesquisadores, o fim da golden share (ações que dão à União direito a veto) em empresas como Embraer e Vale é bem-vindo.
— Muitas estatais são utilizadas para atender a interesses políticos, o que aumenta a dificuldade para a privatização. O grande número de empregados, acima de 500 mil, e passivos trabalhistas, incluindo fundos de pensão, também dificultam o processo — disse Valdir Simão.
Procurado, o secretário de Estatais do Ministério do Planejamento, Fernando Soares, negou que o processo de privatização em curso tem objetivo único de resolver o problema fiscal do governo. Ele informou que todas as estatais estão passando por uma reavaliação e que várias serão privatizadas, incorporadas ou terão seu campo de ação alterado para melhorar a eficiência e sair de áreas já atendidas plenamente pelo setor privado. Ele não quis antecipar detalhes:
— Há pouco mais de um ano, estamos nesse processo para que possamos deixar de ser o Estado empresário para ser o Estado regulador.
Redação e O Globo