Futuro secretário da Receita, Marcos Cintra diz que futuro governo fará desoneração ampla da folha de pagamento
Em 6 anos atrás 1309
A equipe econômica do presidente eleito, Jair Bolsonaro, pretende fazer uma desoneração ampla na folha de salários com o objetivo de gerar empregos. O futuro secretário da Receita Federal, economista Marcos Cintra disse que todos os tributos e contribuições incidentes sobre a remuneração dos trabalhadores serão extintos.
— O único imposto que se justifica sobre o salário, a remuneração ao trabalhador, é o Imposto de Renda (IR)— afirmou Cintra.
Atualmente, as empresas recolhem o IR no contracheque, mas quem paga é o trabalhador. Cintra disse que “limpar” os tributos que incidem sobre os salários é prioridade.
ão vários os tributos que incidem sobre a folha. O mais relevante é o INSS patronal, de 20%. Já o Risco Ambiental do Trabalho (RAT) tem alíquotas de 1%, 2% ou 3%. O chamado salário-educação, que financia projetos de ensino fundamental público, tem alíquota de 2,5%.
Há ainda as contribuições para o sistema S. Paga-se 1,5% para financiar o Sesi ou o Sesc, dependendo do ramo da empresa, e 1% para o Senai ou o Senac. Já o Sebrae consome 0,6% da folha. O último tributo, de 0,2%, é destinado ao financiamento do Incra. O FGTS, de 8%, também incide sobre a folha, mas, segundo especialistas, não é considerado tributo.
De acordo com o futuro secretário de Receita, o custo fiscal sobre a folha chega a 50% e, se forem incluídos demais direitos trabalhistas, como 13° salário e abono, a 100%. O modelo, diz, é perverso e não estimula contratações.
— Vamos eliminar todas as incidências sobre a folha de salários. O Paulo Guedes (futuro ministro da Economia) quer dar um choque nos empregos, e a forma de detonar essa bomba é eliminar a carga tributária sobre a folha de salários — disse Cintra que, em entrevista ao jornal Valor publicada ontem, já havia defendido ampla desoneração da folha.
Ajuste no imposto de renda
Na visão de Cintra, o IR também precisará passar por ajustes para se tornar mais justo. Ele destacou ainda que a base de contribuição para o INSS, que tem como referência o mercado formal de trabalho, precisa mudar porque tem fragilidades, diante da grande informalidade da economia brasileira e com o surgimento de novas modalidades de contratação.
Várias alternativas estão em estudo, como criar um tributo sobre pagamento (entradas e saídas), uma espécie de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) ou um imposto sobre o faturamento. Um pacote de alternativas será apresentado a Bolsonaro, disse Cintra. O plano é elaborar as propostas em janeiro, para apresentá-las ao Congresso no início dos trabalhos legislativos, em fevereiro.
Para o especialista em finanças públicas José Roberto Afonso, a ideia de acabar com tributos incidentes sobre a folha é acertada, porém ele lembra que haverá uma enorme perda de arrecadação.
— A ideia é ótima. Eu só não sei aonde vão conseguir tanta arrecadação com outra base — disse Afonso.
No ano passado, a receita com tributos sobre folha de pagamentos chegou a R$ 555,5 bilhões. Só com a alíquota patronal do INSS foram arrecadados R$ 200,6 bilhões. A contribuição das empresas para o INSS financia os pagamentos do regime de aposentadorias, que é deficitário: no ano passado, o rombo foi de R$ 182,4 bilhões.
Segundo Fábio Calcini, sócio do Brasil Salomão & Matthes Advocacia, o custo sobre a folha de pagamentos no Brasil de fato é muito alto.
— Há ainda outros itens, como adicionais, o percentual de 10% sobre o FGTS em caso de demissão sem justa causa e a multa de 40%. É positivo que o novo governo busque a desoneração, mas, como o tema é relevante, ele deveria primeiro dizer objetivamente o que busca e dialogar com a sociedade.
analista: conta não fechA
O advogado citou a ideia de compensar a queda de arrecadação por meio de um novo imposto único sobre movimentações financeiras, nos moldes da extinta CPMF.
— A Constituição não prevê esse tipo de imposto para financiar a Previdência. O governo até poderia instituí-lo por meio de lei complementar, sem mudar a Constituição, mas isso pode levar a questionamentos — explicou.
José Dari Krein, da Unicamp, diz que não há comprovação de que a desoneração leve à criação de emprego.
— Alguns estudos mostram que não há relação estatisticamente significativa entre geração de emprego e flexibilização trabalhista ou redução do custo da folha. Logo, não seria recomendável reduzir o sistema de proteção social com base em uma tese que é muito mais ideológica do que baseada em comprovação empírica — criticou o economista.
Segundo Krein, a literatura econômica mostra que a criação de vagas responde a ciclos econômicos. A prova disso, disse ele, é que, entre 2004 e 2014, houve mais empregos sem mudança trabalhista substancial. No governo Dilma, marcado por diversas iniciativas de desoneração da folha, o desemprego subiu. Ele disse ainda que não faz sentido fazer desoneração diante do quadro fiscal deficitário:
— A conta não vai fechar. A proposta diminuiria ainda mais a base de arrecadação da seguridade social.
Para o presidente-executivo da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso Dias Cardoso, a argumentação de Cintra é “muito positiva”, já que a alta carga tributária sobre a folha limita a competitividade das indústrias.
Nas contas da Abimaq, referendadas por estudo da auditoria UHY Moreira, o custo dos encargos trabalhistas no país é, em média, 71% do salário bruto da mão de obra. É o percentual mais elevado numa lista de 29 países. Mas, para Velloso, há a preocupação sobre como desonerar o trabalho sem desmontar completamente instituições que dependem das contribuições trabalhistas, como a Previdência Social, o FGTS e o Sistema S:
— Se tirar o INSS da folha, como vai resolver o problema da Previdência?